terça-feira, 27 de novembro de 2007

O Ditador Amigo (1): O Paquistão quebrado em dois ou três

Repórter veterano e Prêmio Pulitzer, Steve Coll aproveita a atual edição da New Yorker para comentar o dilema paquistanês:

O país vive duas crises simultâneas. A mais visível é a entre Musharraf, judiciário e políticos civis, que não se entendem a respeito de eleições e divisão de poder – uma disputa entre líderes incapazes de chegar a um acordo que culminou, há duas semanas, na declaração do estado de emergência, seguido por um ataque do exército a ativistas de direitos humanos, jornalistas independentes e militantes políticos. Este desentendimento se sustenta, em parte, pela competição por espaço de duas forças: os militares, que formam uma instituição ampla, de classe média e evidentemente não-democrática; e o Partido do Povo, uma instituição igualmente ampla e não-democrática (jamais houve eleições internas), um tanto mais pobre. O Partido do Povo começou como um movimento socialista rural liderado pelo pai de Benazir Bhutto, que foi enforcado pelo Exército, e governou o país por três vezes; quando Bhutto tornou ao Paquistão, no mês passado, seus seguidores foram em massa a Karachi para mostrar que ainda podem governar as ruas. A luta entre o Partido e o Exército, no entanto, dificilmente provocará uma grande transformação – as prisões, as nuvens de gás lacrimejante e as bordoadas com cassetete são apenas o episódio mais recente desta história pátria de política disfuncional.

Mais preocupante é a guerra civil de baixa intensidade na fronteira oeste do país, um conflito que envolve o Exército, dominado pela etnia punjabi, contra muçulmanos na região controlada pela etnia patane, que é tribalizada, uma gente conservadora que ajudou na expulsão da União Soviética do Afeganistão e deu origem ao Talibã. O último levante pantane, que se voltou tanto contra políticos seculares paquistaneses quanto contra seus aliados ocidentais, começou já há muitos anos. O Talibã que não se rende e proselitismo por parte de uma liderança da al-Qaeda que está se reagrupando, incluindo provavelmente o próprio Osama bin Laden, estão entre as causas. Mas contribuem para a equação antipatia aos EUA, ajuda de funcionários da inteligência paquistanesa e, talvez, até mesmo gente do exército, que sempre conteve os radicais muçulmanos, além da persistente inabilidade do próprio Musharraf de conseguir criar uma coalizão entre os patanes seus aliados que poderiam conter os islâmicos.

No Paquistão, embora ruidosos, os radicais islâmicos são franca minoria. Os serviços de inteligência podem tê-los como aliados – já que terroristas ajudam na luta contra a Índia na região fronteiriça da Caxemira –, mas são minoria. O governo Musharraf se mostrou de todo incompetente para lidar com o problema e, pior, soldados do Exército já foram obrigados a se render em batalha aos guerrilheiros patanes. É humilhante.

Musharraf está fora – só ele não sabe. A dúvida é quanto tempo terá de sobrevida. O problema, agora, é encontrar um plano B.



Do weblog do Pedro Dória.

3 comentários:

José Elesbán disse...

O ditador amigo 1.

Omar disse...

As águias imperialistas estão apavoradas com a possibilidade de um governo que tem a bomba atômica acabar nas mãos de dirigentes não alinhados. Musharraf parece realmente estar perdendo o controle.

Jens disse...

Perder o controle com uma bomba atômica nas mãos? Brrrr.....