quarta-feira, 2 de maio de 2018

Moro e a "guerra judicial" (lawfare)


O termo lawfare, composto pelas palavras law (lei) e warfare (guerra), foi inventado em Harvard nos anos 90 por intermédio dos programas de empréstimos dos EEUU, em especial do BID, com títulos tão impecáveis como "modernização judicial" ou "fortalecimento do estado de direito". O lawfare se estende pela região e hoje chega até a prisão federal de Curitiba, Brasil, onde o juiz Sério Moro, que em pleno mau uso e abuso do sistema judicial do Brasil já pôs em marcha a reclusão de Lula, para tirá-lo das disputa eleitoral tratando de evitar qualquer reclamação de soberania ante as conquistas oligárquicas-imperiais dos EEUU, em especial do BID

Moro estudou em Harvard, berço do lawfare, e como observou o diplomata Samuel Pinheiro Guimarães, em entrevista a Dario Pignotti (Página/12, 14/02/2017), não deve perder-se de vista "que estamos falando de um membro do Poder Judiciário que foi adestrado no Departamento de Estado, que viaja permanentemente aos EEUU (...) Moro sabe como ganhar a aprovação de Washington". O faz coordenando e ajustando sua função judicial ao golpismo judicial que derrubou Dilma para implantar e agora manter a brutal guerra de classe chamada neo-liberalismo.

Antes de ir para a prisão, Lula ofereceu na semana passada uma histórica reflexão ante dezenas de milhares que encheram as ruas de São Paulo que levam ao Sindicato dos Metalúrgicos. Transmitida pela Telesur da vasta mobilização escutou-se fortemente a voz pública contra a reclusão enquanto Moro, em plena ofensiva judicial, guarda silêncio ante indícios graves de generalizada corrupção de Michel Temer, o ocupante da presidência e informante do Comando Sul. A Europa Press informou que a Procuradoria havia denunciado Temer por subornos da maior processadora de carne através de um de seus assessores. Outros informes oficiais completam um pacote de denúncias do procurador que incluem a obstrução de justiça e suposta associação criminosa.  Com suficientes votos, a parte do congresso favorável a Temer rechaçou a iniciativa de processo que terá que esperar janeiro de 2019, quando termina o mandato deste.

A judicialização da política e/ou a politização do sistema judicial, se realiza a partir de processos vinculados a programas de empréstimos que aumenta o poder do sistema judicial nos estados e na federação a tempo que o penetram. O BID, por exemplo,maneja os empréstimos ao judiciário sob protocolos de funcionamento operacional similares aos aplicados aos programas de "ajuste estrutural", isto é, incluindo as "generosas" e legais comissões para aqueles , sejam altos funcionários ou juízes, operam empréstimos destinados à "modernização judicial", isto é, virtuais "aparatos de suborno" que neste caso fomentam vínculos que alimentam a função judicial com dados selecionados pela espionagem sobre fortalezas e debilidades das elites.

Num estudo de alta qualidade Silvina Romano et al, Lawfare: la vía ‘justa’ al neoliberalismo, detalham o uso político da justiça. Um dos objetivos a curto e médio prazo do lawfare "é conseguir a restauração do neo-liberalismo também por via judicial". Os e as autoras planejam que "se recorra a um estado de exceção por meio de ferramentas (supostamente) legais (assim definidas por um aparato judicial que se elevou por cima dos demais poderes), que nos feitos conduzem à omissão da lei a favor da imposição vi0olenta de uma nova ordem".

Sobre Lula dizem que "na sentença condenatória e durante todo o período de instrução e tramitação que leva o expediente, foram deformados: 1) o estado de inocência; 2) a imparcialidade do juiz; 3) as motivações (doutrinárias) nas decisões jurídicas; 4) a proibição de provas ilícitas; 5) o princípio da igualdade ante a lei; 6) a publicidade dos atos processuais; 7) a ampla defesa; 8) a exigência de jurisdição natural".

Em síntese: a sentença de 238 folhas do juiz Sérgio Moro que como se sugere neste estudo, "mostra o modo em que se constrói uma condenação de 'exceção' no contexto de um estado de exceção". (Ibid) Um Lula sob vingança de Moro, isolado da convivência humana.

O contexto que permite apreciar o fundo deste acontecimento histórico foi oferecido ao público pela maestria jornalística de Stella Calloni no "Brasil: o assassinato da justiça: um golpe no golpe" (La Jornada, 9/04/2018). Antes da decisão do Tribunal Superior Federal  o general Luiz Gonzaga Schroeder Lessa disse ameaçador que o tribunal "induziria a violência no país se Lula não fosse preso e ameaçou com um golpe de Estado".

Fuente: http://www.jornada.unam.mx/2018/04/12/opinion/022a1eco

Lula, o fascismo e a esperança

Página 12


Não há eufemismos banais: o Brasil mostra nestas horas o pior e mais descarnado fascismo contemporâneo. Tirar o Lula da disputa presidencial, e colocá-lo preso, é uma decisão do fascismo brasileiro.

Começa pela mídia corporativa -que na realidade são uníssonos em sua missão de enganar- infetou-se a absurda condenação e veloz prisão. Sem nenhuma prova, nenhuma, de que o ex-presidente brasileiro haja cometido ilícito algum.

Carece de importância o departamento em suposto pagamento de uma suposta propina, que nem sequer é delito provado mas sim apenas "convicção" de um juiz midiático a serviço da Rede Globo. Pode ser um Rolls Royce dado rainha da Inglaterra, ou uma paquera com Natalia Oreiro, ou um avião presenteado por algum narcotraficante. Qualquer fábula disparatada poderia servir a Sergio Moro e/ou qualquer outro juiz ou procurador equivalente em prevaricação, dos que há tantos, muitíssimos, lá e cá.

À operação do grupo Globo, camarada dos mentimedios argentinos, somou-se a prédica de várias décadas de docência reacionária a cargo de dezenas de igrejas espertalhonas e abusadoras da ingenuidade popular. Que no Brasil tem um imenso poder. Dizem-se missionárias, salvadoras e milagreiras, lá estão -como aqui cada vez mais, e patrocinadas por quase todos os governos nacionais e provinciais- para formatar a ignorância de milhões de seres humanos, pobrezinhos, que fartos de serem caloteados acreditam em qualquer coisa.

Com esses ingredientes -mentiras, falsas convicções, carência de provas e muita agitação na televazia nacional- e com poderes judiciais, com minúsculas, que são proverbialmente injustos servidores do poder de plantão, hoje se pode condenar a qualquer pessoa. Sobretudo se essas pessoas tem influência, ideias, reconhecimento e trajetórias de decência e honradez. E nem se projeção política, como é o caso de Lula da Silva, cujo teto político é todavia, e apesar destas bestialidades jurídicas, incalculável.

É claro que as exceções a estes barbarismos políticos e judiciais -que há, claro, lá e cá- são simplesmente só isso: exceções. Porque a regra epocal, a marca destes tempos, é a mentira e o engano; o calote e a banalização; o envolvimento das massas que "creem" ao invés de pensar.


Assim as mídias e a telelixo, do Brasil mas também de todo o continente -e do mundo, se me permitem- inventou e plantou e regou esta rede destruidora de uma das figuras políticas mais interessantes, atrativas e reformistas de Nossa América. E o fez com a mesma estratégia que impera entre nós e que se impôs há anos na república irmã do Chile, que hoje encabeça o ranking mundial de desigualdade social. Como o mostro invertebrado e sigiloso que é, capaz de entrar em todos os lugares e submeter todas as mentes e todos os corações, se impõe dia a dia e hora a hora abusando da "pobre inocência das pessoas" (León), essa que "acredita nas revistas" (Charly) e a televisão, e agora às infâmias reproduzidas ao infinito pelas chamadas redes sociais, que na realidade são anti-sociais e inclusive contra-sociais.

É por isso que velhos diários e a velha televisão, agora envolvidos com cabos e netflixes, de maneira cada vez mais precisa e veloz e voraz, agora também se apoderaram aqui -servidos pelo governo atual- do universo óptico das telecomunicações. Esse novo, gigantesco e irrefreável sistema tecnológico a serviço de negócios fabulosos e ilícitos quase todos, encarregados de executar o arrasamento de todos os princípios e normas constituicionais.

Então a pergunta é: quem detém estes tipos, estes meios, estes juízes, estes governos, esta maldade de terno e gravata e carros suntuosos que chama de "alta classe"? Quem os para agora que voltam a adoecer de antidemocracia às forças armadas que tanto custou democratizar? Quem, se o único argumento final destes tipos são as forças de choque e o chocobarismo santificado por uma montonera conversa a serviço de portadores de Panamá Papares a rodo? A que magistratura recorrer, a que justiça?

O panorama é desolador. No Brasil e também aqui, onde o silêncio do governo só se pode ler como cumplicidade. Aqui onde se substitui o procurador do caso escandaloso do Correio e a família presidencial.

Então o que nos resta é primeiro informar-nos. E refrescar a memória dos conscientes  e ainda restam, dizendo-lhes que isto se chama Fascismo. E que assim sempre funcionou. Na Europa e na Ásia e na África, e em toda a América.

Refrescar a memória é necessário, e com as palavras precisas: quando os fascistas procedem, como agora contra Lula no Brasil, isso é só espelho do que nos passa e seguirá passando com estes tipos que marcham dia a dia até o funeral da Democracia.

O que nestas horas se vive no Brasil equivale a um golpe de Estado. Sem dissimulação, sobra de hipocrisia, com um cinismo fenomenal que em todo o continente com com "jornalistas" -e há tolos entre eles- que são capazes de justificar o que seja. E assim o fazem.

Nesse espelho devemos ver-nos hoje. Mas não para chorar e desesperarmos, mas sim para remontar. Porque a esperança não morre, apesar de tudo. E porque apesar de dirigências que mostram suas mesquinharias diariamente, a esperança segue chamando democracia, paz, consciência cívica e sobretudo decência.

Em países corruptos a mancheias, a esperança está em não sê-lo. Em países de mentiros, a esperança está em não mentir. Em países conquistados pelo fascismo, a esperança e a carta de triunfo está em pensar e dizer o que se pensa, e logo atuar como se diz. Somente assim a política é digna e é boa, e vence, como sempre venceu, aos fascistas.


Fuente: https://www.pagina12.com.ar/106836-lula-el-fascismo-y-la-esperanza

Da guerra anticomunista à guerra anti-corrupção

Ollantay Itzamná

A guerra contra a corrupção é tão falsa como foi a guerra contra o comunismo.

Durante o século XX, em especial em sua segunda metade, a América Latina foi um campo sangrento da falsa guerra anticomunista jamais vista no mundo ocidental.

Somente na Guatemala, os projéteis 'made in USA', assassinaram mais de 200 mil pessoas inocentes (cerca de 90% indígenas). O Plano Condor, na América do Sul, deixou cenários dantescos similares perseguindo comunistas inexistentes.

Nesse período, o defensor da democracia derrubou presidentes constitucionais, e promoveu ingentes golpes de Estado. Cooptou os órgãos executivos dos estados centenários com militares servis para aniquilar as legítimas expressões políticas de emancipação.

Décadas depois, os povos sobreviventes daquele holocausto constatamos que a Doutrina de Segurança Nacional e sua guerra anti-comunista, não só era falsa, mas também uma efetiva dose de veneno social que paralisou sócio-politicamente por várias décadas. Enquanto isso, a desigualdade, a miséria, e o saque violentos de nossos bens comuns fizeram gemer até os próprios deuses e demônios insensíveis do céu longínquo.

A aurora do século XXI nos encontrou, a muitos povos latino-americanos, com brios de liberdade e vontade para prosseguir com nossos processos emancipatórios truncados. E, em menos de duas décadas, nossos governos progressistas (com políticas de investimento social e redistribuição direta de renda) conseguiram tirar da condição de pobreza mais de 60 milhões de latino-americanos.

Assim, estes governos dignos fizeram retroceder as porcentagens de pobreza e desigualdade a nível global na região. Enquanto isso, em países como os EEUU, México, Guatemala, Honduras, Colômbia, Peru e outros, no mesmo período, milhões de pessoas da classe média ingressaram nos nichos de pobreza, com descomunais dívidas públicas.

Neste contexto, e ante os soberanos acordos de integração latino-americana sem a presença norte-americana, aparece a farsante e midiática guerra anticorrupção. Com o argumento de: a corrupção pública é a causa do atraso dos povos latino-americanos.

Ninguém duvida que a corrupção pública seja um mal a superar. Mas, este mal é apenas um lubrificante do mal maior. Isto é, o mal fundamental da desgraça de nossos povos é o sistema hegemônico vigente que nos saqueia, explora e subordina. A corrupção pública é só um óleo que lubrifica o saque que sofremos.

Mas, a hegemonia midiática (aceita pela corrupção) conseguiu instalar no vulnerável imaginário coletivo de muitos povos da América Latina a ideia sobre a corrupção como pecado original de suas desgraças. E, em consequência, esquecer-se do crescente saqueio multidimensional que sofremos.

A guerra anticorrupção é para aniquilar e escaldar incômodos governos progressistas na região.

Uma vez configurado os sentimentos "pátrios" contra a corrupção, os gringos, mediante os órgãos judiciais dos países sob seu controle, sentaram no banco dos acusados todos os governantes latino-americanos que defenestraram o projeto de anexação comercial denominado Área de Livre Comércio das Américas (ALCA), EM 2005.

Hugo Chávez, Néstor Kirchner, foram demonizados na alma latino-americana antes de serem linchados judicialmente. Ao legendário Lula do Brasil, que tirou da pobreza cerca de 50 milhões de pessoas, o lincharam judicialmente, sem respeitar o devido processo. Com a evidente intenção de prevenir um terceiro governo dele.

Evo Morales,, da Bolívia, Daniel Ortega da Nicarágua, Rafael Correa do Equador, Nicolás Maduro da Venezuela, e outras/os, não participaram do IV Encontro das Américas no Rio da Prata. Mas a ordem para o linchamento judicial já estava em movimento.

O ridículo desta falsa guerra contra a corrupção é seu caráter de duas medidas. Enquanto isso os sistemas judiciais, operacionados pela cooperação técnica e financeira gringa (USAID), são ágeis para sentenciar/encarcerar funcionários ou ex-funcionários de governos progressistas, mas com os corruptos neo-liberais são lentos e permissivos.

Fizeram crer aos guatemaltecos e latino-americanos sobre a eficiência da luta contra a corrupção na Guatemala. Inclusive encarceraram a dois ex-presidentes, envolvidos em atos de corrupção. Mas a três anos da apoteótica inauguração desse teatro, não existe sentença judicial condenatória alguma contra os ex mandatários. E mais, estes ex-governantes vivem num quartel militar exclusivo, com todos os serviços necessários que milhões de guatemaltecos "livres" não tem. Esperando o descumprimento oportuno. Enquanto isso, são bodes expiatórios no teatro gringo da luta anticorrupção.

O Peru, é outro caso de sociedade teledirigida enganada com o vulgar teatro da luta contra a corrupção. Aplaudem e festejam as momentâneas detenções judiciais de seus ex-governantes corruptos e neo-liberais. Mas, este saem livres dos cárceres e são recebidos como heróis pelos gringos nos EEUU.

Por que o presidente Macri da Argentina, ou Temer do Brasil, com denúncias e evidência de atos de corrupção, não são destituídos e encarcerados? Por que os ex-presidentes Fujimori, Garcia, Toledo, Humala, Kuczynski... andam soltos pelo mundo?

O peruano ou o guatemalteco médio acredita que os agentes e ex-agentes dos governos progressistas latino-americanos são os mais corruptos. Mas, enquanto se distraem crédulos no teatro de mau gosto da luta contra a corrupção, consórcios norte-americanos, canadenses e outros rapinam e saqueiam as riquezas comuns que ainda restam nestes povos.

Em outras palavras, a guerra contra a corrupção é tão falsa como foi a guerra contra o comunismo. Os gringos, nestas duas últimas décadas ocuparam mediante a USAID e outras agências de cooperação os órgãos judiciais para operacionalizá-las para seus interesses e vingar-se dos governantes latino-americanos "mal educados" que abortaram a ALCA.

Neste sentido, a ditadura ianque jamais terminou na América Latina. Só mudou de uniforme. Antes operaram os órgãos executivos, com homens de uniforme militar. Agora, operam a partir de órgãos judiciais, com civis de toga e terno. O objetivo é o mesmo: castigar e sabotar qualquer processo de emancipação dos povos. Mesmo eles sabendo mais que ninguém que a corrupção pública é para o sistema neo-liberal o que o óleo é para o motor.


CALPU

Texto completo em: https://www.lahaine.org/de-la-guerra-anticomunista-a