segunda-feira, 24 de março de 2008

Processo do Exército derruba versão sobre guerrilha


Um processo administrativo de rotina, aberto por um militar interessado em ganhar uma medalha, derruba a versão de que o Exército não tem em seus arquivos documentos secretos sobre as operações contra a guerrilha do Araguaia. Uma série de telegramas e ofícios comprovam também a prisão, o interrogatório e a tortura de militantes do PCdoB que foram capturados vivos e, depois, dados como “desaparecidos”. Desde 1982, quando parentes de guerrilheiros, sobreviventes do movimento armado e pesquisadores pediram na Justiça Federal a entrega dos arquivos para ajudar na localização dos corpos dos “desaparecidos”, o Comando do Exército ou diz que os documentos não existem ou que foram queimados ao final das operações anti-guerrilha, em 1975. Em dezembro de 2004, o então comandante da Força, general Francisco Roberto de Albuquerque, disse que em suas unidades não havia documentos referentes à guerrilha do PCdoB que atuou na divisa dos Estados de Tocantins (na época, Goiás), Pará e Maranhão, de 1972 a 1975, e que resultou na morte de 59 terroristas, quatro civis e 16 militares. Parte dos documentos, carimbados com a palavra “secreto”, com as informações que o Exército diz não possuir, foi entregue, em casa, em 1990, ao tenente da reserva José Vargas Jiménez. Ele é o autor do pedido (que resultou em processo administrativo) para ser agraciado com a medalha do Pacificador, comenda do Exército que lhe foi concedida por ter participado do combate ao movimento armado do PCdoB quando era sargento e usava o codinome “Chico Dólar”. Em vez de manter o sigilo sobre o material recebido, Jiménez publicou um pequeno livro em outubro de 2007, em Campo Grande (MS), onde mora. Isso levou o Exército a abrir uma sindicância para apurar o vazamento de documentos sigilosos. A sindicância foi arquivada em janeiro deste ano, sem negar a autenticidade dos documentos, mas os fac-símiles começaram a circular abertamente neste mês por meio do blog de um outro militar da reserva. Até hoje, o Exército admitiu, no máximo, que os militares que combateram a guerrilha podem ter agido “fora dos ditames legais do Estado de direito”, como disse o general Albuquerque há três anos. Ele reagia à decisão de julho de 2003, da Justiça Federal, que mandou quebrar os sigilos dos arquivos do Exército. Por causa de recursos judiciais da própria União, o assunto tramita até hoje na Justiça sem decisão final. Os documentos oficiais em poder do tenente Jiménez dão provas de que muitos dos mais de 20 terroristas que resistiram até o começo de 1974 não foram mortos em combate. Algemados, eles chegaram com vida às bases de Marabá, Bacaba e Xambioá.


Outro texto da Videversus, jornalismo de adjetivos.


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