segunda-feira, 22 de outubro de 2007

Porto Alegre é demais!

O texto abaixo não é ficção. Deploravelmente, estupidamente, assustadoramente aconteceu (*)

1.

Sexta-feira, 12 de outubro de 2007, 9 horas da noite. Parada de ônibus em frente ao Shopping Praia de Belas. A mulher ergue a mão. O táxi-lotação pára.

- Moço, passa na Cavalhada?

- Passa.

A mulher entra. Junta-se a duas outras que já estavam no veículo.

Nova parada. Sobe um jovem de tênis, bermuda, abrigo, a cabeça coberta por um capuz, as mãos nos bolsos. Senta no último banco.

A mulher se assusta. “É assaltante. Vai assaltar”.

Ela está certa.

O rapaz levanta. Vai até o motorista. Exibe o revólver calibre 38. Anuncia:

- Não quero machucar ninguém. Só quero dinheiro, celular e relógios. Vamos lá, rápido.

Pega o dinheiro e o relógio do motorista.

A mulher, à beira de um ataque de nervos, abre a bolsa em busca da carteira para atender a ordem do meliante. Na pressa, o celular cai. O bandido vê.

- Filha da puta! Querendo esconder o celular, sua vaca! Vou te fuder!, diz furioso.

Encosta o cano do revólver na cabeça da mulher. Ela treme. “Vou morrer, ele vai me matar”.

- Calma moço, calma – implora. Caiu sem querer. Toma, pode levar tudo.

Ele leva as bolsas das três mulheres. Desce e sobe na garupa de uma das duas motos que acompanhavam o lotação. O chofer ainda pede:

- Pô, cara, devolve os documentos.

As mulheres declinam a gentileza:

- Deixa pra lá. Fecha a porta e toca esta merda!

***

2.

Bairro Cristal, 35ª Delegacia de Polícia.

A porta está fechada. O chofer bate com os punhos fechados, esmurra, grita pedindo a presença de alguém. Abre-se uma fresta. Um policial com cara de poucos amigos pergunta:

- O que é?

- Fomos assaltadas. Queremos prestar queixa, diz a mulher.

Entram. O homem da lei diz que precisam esperar um pouco, pois está jantando. Há movimento nos fundos do prédio. Risos, vozes.

- Não. Estamos muito nervosas, queremos fazer a ocorrência e ir logo para a casa, diz a mulher.

O homem emite um muxoxo e sai.

- Já volto.

Retorna com um copo plástico cheio cerveja numa das mãos. Na outra um prato com salada de maionese, salsichão e um naco de costela gorda.

Enquanto registra a queixa, chega um homem vindo da rua.

- E aí Peçanha, tudo bem?

- E aí, Waltinho? Chega lá nos fundos, o pessoal tá fazendo churrasco.

- Opa, legal. Quem tá aí?

- A turma toda. As gurias também vieram, a Rose, a Lu, a Martinha...

- Beleza. Tu vai demorar?

- Não. Já tô terminando aqui.

Concluída a tarefa, entre uma garfada, um gole de cerveja e uma batucada no teclado do computador, o servidor público dá uma cópia do Boletim de Ocorrência para cada uma das mulheres:

- Na próxima vez em que saírem à noite andem de táxi. É mais caro, mas é mais seguro - aconselha o servidor público pago para servir e proteger a sociedade.

Displicente, deixa claro que nada será feito para tentar prender o bandido e reaver os pertences roubados.

Nesta noite, pelo menos, não. É noite de festa.

***

(*) Ah, sim, não saiu no jornal.

Afinal, "a dor da gente não sai no jornal" (Luis Reis / Haroldo Barbosa - Chico cantou, muito tempo depois).


Da Toca do Jens.

Um comentário:

Omar disse...

estou aguardando as próximas eleições para ver se mantenho minha fé na humanidade