sexta-feira, 14 de março de 2008

A água de Malraux e a água de Sarkozy

Brasil

André Malraux, glória da França, veio ao Brasil como ministro da Cultura do presidente De Gaulle. Foi recebido por Juscelino presidente, em Brasília, que chamou de "Capital da Esperança", e de volta, no Rio, fez conferência na Associação Brasileira de Imprensa.

Na mesa, Oscar Niemeyer, Austregésilo de Athayde, da Academia Brasileira de Letras, Danton Jobim, Prudente de Morais, neto. O auditório quente, abafado, enfumaçado, lotado de políticos, jornalistas, escritores.

A noite espichava e Malraux, suado, avermelhado, com seu francês rápido e côncavo, contava aventuras e lutas, a libertação da China, a resistência da Espanha, o "maquis" da França, as esperanças do homem.

Diante de Malraux, intocado, um copo dágua. Lá de trás, levanta-se um senhor alto, moreno, cabelos grisalhos, terno branco, gravata vermelha e sai andando em direção à mesa. Ploc, ploc, olhar firme, erecto. Como um general. Malraux pára, fica olhando. O auditório não entende, sussurra. E o homem vai em frente, passos fortes, cabeça levantada.

Chega perto da mesa, estira o braço, pega o copo dágua do conferencista, bebe gole a gole, põe o copo no lugar, volta, ploc, ploc, senta-se. Malraux apenas sorriu e continuou. Era o deputado federal Fernando Santana, comunista do PTB da Bahia, que na véspera tinha sido eleito, pelos jornalistas de Brasília, o melhor parlamentar do ano.

Na saída, os amigos escandalizados:

- Mas, Fernando você bebeu a água do orador?
- Água é para quem tem sede. Água não tem propriedade privada.

França

Domingo, os franceses beberam a água de Sarkozy.

(Sebastião Nery, na Tribuna da Imprensa de ontem)

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